Querido Uri, Tem dois anos que tenho esta carta guardada, mostrei a algumas amigas ao longo desse tempo e elas ficam sempre preocupadas comigo. pensam que eu estou com depressão, que eu posso fazer älguma doidera como elas dizem, mas isso embora tenha passado ha muito na minha cabeça hoje em dia não mais. queria uma opinião sua.
“Algumas pessoas nascem, outras são abortadas.
Algumas pessoas não nascem, são
abortadas mesmo continuando vivas. Nascer é ser querida pela vida. É se
conectar com o mundo, é dar um grito e
respirar, é ser querida, amada, desejada, bonita. Eu não nasci. Fui abortada. A
vida nunca me quis. Ninguém nunca me quis. Eu nasci pesada, triste , feia,
lenta, sem vontade.
Pra mim tudo sempre foi avesso. O
rio sempre correu ao contrario. Sempre estive no negativo da foto, nunca fui
revelada.
Algumas pessoas nascem, elas
cabem no mundo, elas facilmente pertencem a um família, a um grupo, a uma
cidade a um pais, elas torcem pra um time, tem amigas, vão ao shopping,
paqueram os garotos e são paqueradas de volta. As pessoas abortadas ficam
assistindo essas coisas afastadas, em terceira pessoa, como se um vidro as
separasse de todo o resto. Desgrenhada, descabelada, olhando as outras meninas
lindas com suas passadeiras vermelhas e seus cabelos lisos negros brincando no
parquinho que nunca era acessível, nunca, nunca......
Eu fui abortada, nasci
geneticamente triste, minha vida nunca teve cores, apenas tons de cinzas e
promessas não cumpridas como aquela boneca que falava umas duas besteiras que
todas, todas as meninas conhecidas tinham, menos eu. –shyrlley, você não é todo
mundo! Não sou mesmo. Eu não nasci. Eu fui abortada. Fui abortada negra, lésbica,
gorda, feia, burra, lenta, doente mental, numa sociedade de exclusão.
As pessoas normais, as que
nascem, tem suas experiências no tempo certo. Eu nem sei se tive experiências. Eu
tive traumas. Fui roubada literalmente, fui estuprada, fui roubada de mim
mesma, tive meus sonhos destruídos, tive a mim mesma destruída, virei um
mostro, virei um lixo, desci num poço, desci mais ainda, virei mais lixo, quase
morri, quase morri duas outras vezes, deixei de me importar, voltei a me
importar e me decepcionei por me importar.
Fui abortada e me acostumei com
isso....
A vida não me quer, nunca me
quis, mas eu não quero desistir, afinal tantas outras pessoas são abortadas e
continuam caminhando ai no limbo.... Vida, quem é você para me querer ou não?
Pelo menos um dia no ano você não
pode fazer chacota de mim, pois no dia 2, eu tenho os mortos e eles não são
seus, eles não são vivos, eles foram de vez abortados de você sua desgraçada!”
Shyrlley minha linda, te peço que entre em contato com o telefone que te mandei pelo e-mail, de preferência ainda hoje para conversarmos um pouco. que tal?? grande abraço!!!
Eu acho que Shyrlley acabou de criar um termo novo, pelo menos para mim, para uma pessoa que passou a vida toda sofrendo bullyng apenas porque não se encaixava na caixinha de expectativa (modelo padrão), da sociedade. A pressão é tão grande que ela não tem apoio nem dos pais ou família. Imagina você crescer ouvindo de todos que você não se encaixa e não ter com quem falar sobre isso. Eu já acho que ela é uma heroina por sair viva disso.
ResponderExcluirShyrlley eu acho que entrar em contato com Uri vai te ajudar muito. Ele já me ajudou muito também num momento bem difícil. Vá bater um papo com ele! Mal não vai fazer.